:: EDIÇÃO 014 :: Estética Musical

MÚSICA E SEU CÓDIGO DE LINGUAGEM

Segundo o dicionário Oxford, a linguagem é estudada pela Linguística e significa qualquer meio sistemático de comunicar ideias ou sentimentos através de signos convencionais sonoros, gráficos, gestuais, etc. Um desses sistemas convencionados é a notação musical, que é um sistema de símbolos e convenções gráficas utilizadas para tentar representar os elementos musicais.

O que era antes transmitido de forma oral, a partir do século IX, tem início a escrita musical, com o que se nomeou de Notação Neumática. Consistia em símbolos gráficos simples colocados acima das palavras para indicar a melodia aproximada. A partir do século XI veio a notação quadrada, eram quadrados desenhados para representar diferentes alturas musicais. Gradualmente as linhas da pauta musical foram adicionadas para indicar melhor as alturas.

Durante o final da Idade Média e início do Renascimento, surge a Notação Mensural. Ela permitia indicar não apenas as alturas, mas também a duração das notas de forma mais precisa. No período Renascentista, houve um grande desenvolvimento da polifonia,  esta se refere à prática de combinar várias vozes independentes. Cada voz mantém sua própria melodia, ritmo e intervalos, criando uma textura musical mais complexa.

No período Barroco, a tonalidade tornou-se uma parte muito importante e a notação continuou a seguir esse desenvolvimento incluindo sinais como os ornamentos e as indicações de dinâmica. Já durante o período Clássico, a notação musical foi se tornando mais padronizada, as formas musicais como a Sonata (tipo de composição musical para um instrumento solista) e a Sinfonia (tipo de composição para orquestra), tiveram destaque e as regras de notação foram estabelecidas de maneira mais firme, trazendo consistência a escrita.

No Romantismo foram exploradas novas formas de expressão musical, a notação agora com sua evolução refletia melhor as intenções emocionais e artísticas dos compositores, incluindo expressões mais detalhadas como a dinâmica e articulação. A música do século XX até os nossos dias trouxe a experimentação e inovação na escrita com a introdução de técnicas chamadas estendidas, utilização de gráficos, uso de notações não tradicionais e a Música Eletrônica. A notação foi se adaptando para dar conta de uma ampla variedade de estilos e abordagens (se refere a técnica estendida).

Segundo Condé, houve aspectos positivos e negativos no desenvolvimento da escrita musical ocidental. O progresso da impressão e da edição permitiu ampla difusão das experiências dos compositores ocidentais através da documentação mais precisa das composições que possibilitou a preservação de obras ao longo do tempo. Criou uma linguagem que transcendeu as barreiras linguísticas. Na educação musical possibilitou o estudo da Percepção Musical a partir das peças musicais de outros períodos da História. Permitiu que os compositores tivessem novas ideias e inovações a partir de experimentações.

Candé 2001, citando J. Handschin, diz que a notação debilita o sentido musical. Sobre a influência da notação à memória musical, fiel onde se impõe à tradição oral, se enfraquece e se degrada sob a influência da notação. Segundo Handschin, ela cria uma categoria de músicos executantes, distintos dos criadores, ela acentua uma especialização prejudicial à cultura musical coletiva. Ela privilegia a partitura a tal ponto que faz dela o objeto primordial da música, precipitando o declínio dessa cultura.

A mudança provocada pela escrita musical ocidental foi muito profunda, ela inicia a maneira de estabelecer como os sons devem ser produzidos criando uma incapacidade de estabelecer as sutis flutuações agógicas (é a parte da música que estuda a velocidade ou andamento com que cada peça musical deve ser executada) do ato musical.  A música é obrigada a se tornar notada e segundo Candé, a decadência da música grega vem, em parte, desse movimento e os linguistas poderiam lembrar dos escritos de Saussure denunciando o perigo de a escrita afetar a linguagem.  

A escrita musical pode oferecer benefícios, e é importante observarmos também os desafios que ela pode apresentar. Encontrar esse equilíbrio talvez possa trazer a possibilidade de uma inovação responsável, uma educação musical em que englobe a cultura musical dos países, valorizando a diversidade e adaptação contextual. Com isso pode continuar a desempenhar o papel na documentação, preservação e transmissão da música se adaptando às necessidades e diversidade do cenário musical.

Referências Bibliográficas

Candé, Roland de – História Universal da Música: Volume 1 / Roland de Candé; tradução Eduardo Brandão ; revisão de tradução Marina Appenzeller , - 2ª edição – São Paulo : Martins Fontes, 2001.
Grout, Donald e V. Palisca Claude – História da Música Ocidental: Donald J. Grout e Claude V. Palisca; tradução Ana Luísa Faria, revisão do texto José Soares de Almeida, - 4ª edição – Portugal: Gradiva Publicações, janeiro de 2007.




Portella
47 anos de vida e Fé cristã. Mestre em Educação. Pós-graduado em Aperfeiçoamento de Docência com Psicopedagogia. Licenciatura Plena em música. Bacharel em Composição. Bacharel em Gestão e Administração Eclesiástica e Música Sacra.
https://modal.asaphministerios.com/equipe/portella

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