:: Edição 002 :: Sociologia

CARACTERÍSTICAS DIALÓGICAS NA LÓGICA DA ORALIDADE E NA LÓGICA DA ESCRITA

Proximidades entre a fala e a escrita propiciada pelas formas de comunicação, indica interseções que sempre existiram a partir das lógicas orais e de escrita, ocorrendo mudanças nas percepções, mentalidades e organizações sociais decorrentes do modo de construir diálogos.

Na valorização da oralidade, Marcuschi (2007), diz: “sob o ponto de vista mais central da realidade humana, seria possível definir o homem como um ser que fala e não como um ser que escreve”. E na valoração da escrita, temos na fala de Antonio Faundez (2008), que a perspectiva antagônica da relação entre oralidade e escrita está entre os principais motivos do fracasso de programas de alfabetização, a escrita é avaliada como superior, mais correta e precisa que a oralidade.

Pesquisadores, Walter Ong, Jack Goody e Marshall McLuhan estão entre os mais representativos, estudaram as semelhanças e diferenças entre culturas orais e culturas que fazem uso da escrita, percebendo na percepção, na mentalidade e na organização social características distintas nessas culturas.

“A expressão oral pode existir — e na maioria das vezes existiu — sem qualquer escrita; mas nunca a escrita sem a oralidade” (ONG, 1998). 

Walter Ong, investigando culturas intocadas pela escrita, destaca que reter e transmitir o conhecimento por meio da memória, é significativo e marcante, afetando a forma como constroem os discursos: padrões rítmicos, repetições, antíteses, rimas, epítetos, expressões formulares, provérbios; padrões que facilitam a memorização e repetição. 

Pensamentos e expressões tenderiam a ser mais aditivos que subordinativos nas culturas orais; informações são conectadas por um somatório de “e”; fórmulas prontas com valores agregados são muito usadas: “Não o soldado, mas o soldado valente; não a princesa, mas a bela princesa” (ONG, 1998).

Com a escrita, dados podem ser retidos num volume muito acima da capacidade humana de memorização e, sendo autênticos, diminuem os riscos para ambas as partes; ela permite a comunicação de um indivíduo consigo mesmo, possibilitando a reelaboração do próprio trabalho. Cada vez mais o letrado vai se tornando condição para se ter acesso a privilégios envolvidos no domínio da escrita. É fácil entender a partir desse momento histórico a restrição que houve sobre o acesso à instrução.

Vivemos um momento social com paradigmas simultaneamente. Experiências nos fazem “pensar fragmentariamente e em planos únicos e separados entre si” (MCLUHAN, 2011). 

No Brasil, socialmente se tem uma mescla de ambientes letrados, não letrados e residualmente orais, seja na fala, seja no canto, as práticas orais gozam de um prestígio e têm um impacto muito expressivo, chegando a influenciar e intervir muito na escrita.

Luria, em seus estudos sobre a apropriação da escrita, observou que, em etapas inicias de aquisição da escrita, predomina a influência da fala. “Na linguagem escrita desta pessoa, em parte se transferem os procedimentos da linguagem oral” (LURIA, 1986). Enquanto que em momentos posteriores é a fala que será influenciada pela escrita: “Frequentemente, as regras desta linguagem começam a se transferir para a oral e o sujeito fala como escreve” (LURIA, 1986). A isomorfia entre fala e escrita, ao que tudo indica, tem profunda relação com o gênero (sentido)utilizado. Ou seja, existem gêneros (sentido falados e escritos) que se aproximam mais da fala e existem gêneros (sentidos falados e escritos) que se aproximam mais da escrita.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAGNO, M. A norma oculta: língua & poder na sociedade brasileira. São Paulo: Parábola Editorial, 2003. 
FAUNDEZ, A. “Alfabetização, pós-alfabetização e cultura oral na educação africana”. In: GADOTTI, M. História das ideias pedagógicas. São Paulo: Ática, 2008. 
GOODY, J. A lógica da escrita e a organização da sociedade. Lisboa: Edições 70, 1987. 
KATO, M. No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística. São Paulo: Ática, 1986. 
LURIA, A. R. “Principais formas de alocução verbal. Linguagem oral (colóquio e monólogo) e linguagem escrita”. In: LURIA, A. R. Pensamento e linguagem: as últimas conferências de Luria. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986. 
MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, 2007. Gêneros textuais emergentes no contexto da tecnologia digital. In: MARCUSCHI, L.A.; XAVIER, A.C. (orgs.) Hipertexto e gêneros digitais: novas formas de construção do sentido. Rio de Janeiro, Lucerna, 2005. 
MCLUHAN, M. A galáxia de Gutenberg: a formação do homem tipográfico. São Paulo: Editora Nacional, Editora da USP, 1972; FIORE, Q. O meio é a massagem: um inventário de efeitos. Rio de Janeiro: Ímã Editorial, 2011. 
ONG, W. Oralidade e escrita: tecnologização da palavra. Campinas: Papirus, 1998.




Rovany Pimenta
61 anos de vida e Fé cristã. Doutor em Fenomenologia Existencial. Mestre em História Social. Pós-Graduado em: Teologia Filosófica Educacional; Psicoterapia de Orientação Analítica; Gestão em Educação e de Pessoas; Psicopedagogia – Aperfeiçoamento do Docente; Artes Cênicas – Educação Musical/ voz e regência. Bacharel em Teologia, Artes Cênicas e Psicoterapia de Orientação Analítica.
https://modal.asaphministerios.com/equipe/rovany-pimenta/

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