As potenciais tensões relacionais acarretadas nos vínculos e relações sociais são tema de grande recorrência no pensar sociológico. Questões como a dicotomia entre ação e estrutura e os posteriores arranjos subsequentes que procuraram reescrever a questão em termos menos dicotômicos e mais dialógicos marcaram a história do desenvolvimento histórico, epistêmico e conceitual da sociologia enquanto um saber científico. Uma das maneiras como essa problemática se manifestou foi na discussão a respeito da noção de secularização e seus desdobramentos.
A noção de secularização já foi entendida a partir de três aspectos. Um aumento na diferenciação estrutural entre os espaços sociais, resultando em uma separação da religião em relação à política, economia e às demais esferas sociais; a privatização da religião em sua própria esfera e o declínio da Significância social das crenças, pertencimentos e instituições religiosas. Essa noção, contudo, foi alvo de críticas importantes, pois davam aos processos que caracterizam a secularização um caráter normativo, como um desenvolvimento necessário e que indica um formato muito específico de relacionamento entre indivíduos e instituições e crenças religiosas para com as demais dimensões da vida social. Quando esse padrão não era encontrado, entendia-se falar do lugar da falta.
Os desenvolvimentos futuros desta crítica passaram a apontar para um questionamento importante: qual seria o tipo de religião a qual está direcionada a noção clássica da secularização? O argumento que é então proposto é o de que essa noção aplica-se somente a religiões que estão dispostas a entrar na esfera pública encarando-a como uma esfera de debate racional, com opositores que precisam ser persuadidos. Religiões que aceitem o ideário liberal, no qual a tolerância é buscada nas bases de uma distinta relação entre lei e moralidade própria desse formato político e societal.
Outra ideia importante é a de que o próprio espaço tido como ideal por essa concepção clássica tinha importantes dimensões ignoradas por este discurso. Isso porque o coração desta crítica está na afirmação de que ela é um espaço necessariamente articulado pelo poder e quem adentra nele precisa lidar com a disposição do poder de pessoas e de coisas. Portanto, nela, ter voz pressupõe não somente a capacidade física de falar, mas também a capacidade de ser ouvido. Isso indica que fazer alguém te ouvir, mesmo que este prefira não fazê-lo; falar gerando alguma consequência de modo que algo no mundo político seja afetado, ter a habilidade de tomar decisões práticas nas bases dessa conclusão, tudo isso está incluído na noção da liberdade de expressão como uma virtude liberal.
Por fim, estas perspectivas críticas também ressaltam que opções tomadas como basilares por aquela concepção clássica não são abertas a todos, pois o direito de livre expressão é formatado por limites pré-estabelecidos. Desde limites formais até práticas convencionais de confidencialidade. Os limites que se fazem sentir na livre expressão na esfera pública não advêm apenas da lei e da convenção – poderes externos – , mas são, também, intrínsecos aos indivíduos. Mais ainda, estão também relacionados ao tempo e espaço necessários para construir e demonstrar um argumento em particular, entender uma experiência em particular e, em última instância, se tornar sujeitos de fala e escuta. Estão relacionados ao tipo de pessoa que alguém se torna e que continua a ser. Logo, tanto a esfera pública quanto uma fala livre não se constituem de modo instantâneo e/ou isolado, mas são, antes, fruto de uma complexa e extensa cadeia de afetações e vínculos.