A reivindicação da religião como um elemento constitutivo da vida pública é um fenômeno que tem crescido em relevância nas últimas décadas. Esse elemento, dentre tantas outras implicações ao pensamento, traz à tona a questão do relacionamento entre as várias hermenêuticas construídas para dar sentido a uma realidade cada vez mais plural e fragmentada, e aquilo que se considera enquanto elementos de uma revelação. Esse cenário, contudo, não se trata de algo inteiramente novo. A novidade pode estar apenas no fato de que este fenômeno tem sido vivenciado em um contexto específico, caracterizado pela imposição do paradigma cultural da modernidade ocidental e por se desenrolar depois de séculos de dominação colonial e neocolonial. É o que acredita Boaventura de Sousa Santos.
Santos observa que depois de muitos anos de conflitos na Europa, o paradigma da modernidade ocidental alcançou uma nova e inovadora resolução para a questão religiosa: Por um lado, os valores do cristianismo foram aceitos como universais, por outro, o cristianismo institucional foi relegado ao domínio da esfera privada e das decisões voluntárias dos indivíduos. Essa resolução seria um “localismo globalizado”, uma solução local que, em função do poder econômico, político e cultural de quem a promove, se expande por todo o globo, construindo cenários frágeis e em constantes negociações e nuances quando encontram as realidades particulares às quais tentam se impor. É no contexto deste quadro analítico que o autor concebe o conceito de Teologia Política, caracterizando-o enquanto uma categoria que engloba os diferentes modos de conceber a intervenção da religião, entendida enquanto mensagem divina, na organização social e política da sociedade.
Essa consideração levou à construção de uma distinção entre duas formas de interpretar a relação entre revelação e história, e as tensões derivadas dela. O autor observa que cada tipo de teologia política oferece uma determinada articulação para a questão, dividindo-as em dois tipos ideais. Para as teologias pluralistas, a revelação ocorre em um contexto político e social determinado, estando seu valor relacionado à abertura a novos contextos e sua relevância vinculada a sua capacidade de lidar com as necessidades e demandas sociais e existenciais de um tempo específico. Assim, as Teologias políticas pluralistas concebem uma religião na história. As teologias políticas fundamentalistas, por sua vez, entendem que a revelação, sendo eterna, é acontextual e, logo, contém em si mesma todas as possíveis necessidades históricas, bem como todos os acidentes que levaram a sua emergência. Desta forma, o que está em jogo nesta concepção, segundo observa Santos, é a ideia de uma história dentro da religião.