Dentro da tradição ibérica e latina do desenvolvimento da escrita tratadística existe uma certa estabilidade do seu vocabulário ao longo do tempo, como aponta Quentin Skinner. No âmbito da teoria política e filosófica, e que reverbera, em outros tipos de fontes primárias para pesquisa histórica, coloca-se uma problemática para os leitores contemporâneos descompromissados ou envolvidos com pesquisa histórica: a manutenção da forma (signo), os usos e expressões de uma época anterior.
O período do Renascimento, entre os séculos XIV e XVI, foi marcado pelo esforço de recuperação de textos clássicos greco-romano pelos humanistas, assim chamados os estudiosos das “studia humanitatis“. A tradução, leitura e escrita de textos de pensamento político na época feita por esses intelectuais resgataram conceitos, significados e visões de sociedades políticas das cidades-estados gregas e da República Romana. É possível perceber em alguns textos a manutenção do signo linguístico, a exemplo de “democracia” ou “república”, ou até mesmo “virtude” como também as traduções e adaptações para a língua latina da época, como “governo popular”, no caso de democracia, ou de “licença” para “oclocracia”.
O resgate destes escritos possibilitou a manutenção, mas também de acréscimo, de uma forma de conceituar determinadas ideias de sociedade e formas de governo, bem como de concepções históricas, mas conotando com ideias e expressões a partir de um universo político e contexto linguístico de uma ideia dessa época e desse espaço europeu. O legado foi a continuidade e perpetuação de conceitos/ideias na forma escrita nas línguas latinas, mas que impõe desafios e também confusões numa leitura apressada pelos olhos contemporâneos (aqui entendido como de qualquer época, como os contemporâneos renascentistas a esses textos de resgate humanista, ou nós hoje, contemporâneos)
O desafio, portanto, exige métodos de pesquisa e leitura que permitem contextualizar não só o significado de um conceito para a sua época (o significado atribuído a forma escrita da palavra ou a sua tradução), mas o seu uso pelos agentes que enunciam e adotam em suas estruturas linguísticas e filosóficas.